06/07/2024 13h05 | Por: Alexandro Sousa/teixeiraurgente MTB 6235/BA
Na manhã desta sexta-feira, 5 de agosto, uma audiência de conciliação foi realizada no Plenário da Câmara de Vereadores de Alcobaça Wilson Alves de Brito, para discutir a posse da terra onde atualmente se encontra o bairro Canãa. A audiência envolveu o suposto proprietário da terra, que alega possuir 57 hectares, e os representantes dos moradores da associação Canãa.
Durante a sessão, os moradores expressaram insatisfação com a negociação proposta. A advogada do suposto proprietário, doutora Janaína, afirmou que a propriedade do terreno está devidamente registrada e comprovada nos autos, com decisões reiteradas pelo Tribunal de Justiça da Bahia confirmando que a área deve ser reintegrada ao proprietário.
Questionada sobre uma possível doação do terreno para o município pelo ex-governador Jaques Wagner, a advogada negou qualquer conhecimento de tal documento, reforçando que a matrícula do imóvel é válida e reconhecida judicialmente.
O juiz substituto da comarca do Prado, doutor Gustavo Vargas Quinamo, confirmou que o tribunal já decidiu pela reintegração de posse, mas destacou que a proposta de ceder 50% da área útil aos moradores foi feita por sensibilidade à causa social.
A matéria já subiu ao tribunal, não cabe a mim avaliar o conteúdo da decisão. O Tribunal de Justiça determinou a reintegração de posse, há uma matrícula válida e indicou que os recursos reiterados que foram aforados pela associação poderiam ser julgados improcedentes. Então, coube a nós, de fato, determinar a reintegração. Antes da reintegração, eu como sou sensível à causa social, resido aqui na região, estou aqui sempre. Achei melhor, por bem, fazer essa conciliação ao ouvir a conversa de que, eventualmente, o autor poderia ceder parte dessa área. E, de fato, assim foi feita a proposta da doutora, uma proposta de 50% da área útil.
A área útil vai ser mantida em poder da associação, o prefeito Zico também se dispôs a regularizar a área na REUB. Mas, infelizmente, muito embora tanto a defensoria pública que aqui está quanto o Ministério Público tenham sido assentes em relação à proposta, achado bastante razoável, os coordenadores da associação não aceitaram. Então, para evitar desgaste agora, demos o prazo de 15 dias para que se reúnam em Assembleia Extraordinária e possam discutir a proposta.
Inclusive, isso foi um pedido do defensor público, que vai estar presente, já que ele representa… Não a associação, mas aqueles vulneráveis que ali estão, E é muito importante para nós que eles sejam também tutelados. Não basta apenas os dirigentes da associação decidirem, no destino de tantos, uma coisa que é importante. É importante que eles levem a todos e que a Assembleia venha, eventualmente, a referendar ou não. A questão da titularidade da terra, o tribunal já se manifestou sobre isso.
É uma matrícula válida em nome do autor. Não cabe ao governo do Estado agora discutir a legalidade ou não dessa matrícula. Procedimentos de desapropriação, tudo isso são procedimentos próprios. É uma questão de reintegração de posse, que já caminha há oito anos. E, ao que parece, caminha para um fim que não é o ideal. É uma decisão adjudicada, uma reintegração forçada.
Vamos aguardar a manifestação dos associados em Assembleia. O defensor público vai participar dessa Assembleia. E assim que essa decisão vier aos autos, vamos prosseguir com a determinação do tribunal de reintegração de posse, caso não haja um acordo viável.
Nossa reportagem questionou ao juiz sobre a documentação que o governo do estado, na época do ex-governador Jacques Wagner, teria cedido ao município. O juiz Doutor Gustavo disse o seguinte: “A terra não foi passada ao município. A lei de registros públicos é clara, diz que as matrículas têm presunção de veracidade, validade. E há matrículas válidas sobre a área. E o Poder Judiciário, que é quem dá a palavra final em relação a esse tipo de demanda, já se manifestou. É a quinta turma do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, que, pela terceira vez, desacolheu o recurso e decidiu que a reintegração de posse prosseguisse. Então, como eu disse, a eventual alteração de titularidade da área demanda ação judicial”.
Era um interesse público manifestado pelo então governador Jacques Wagner, é louvável, é válido, mas ela não tem o poder de cancelar a matrícula que consta do CRI, que foi o laço com o qual o Tribunal se apegou para decidir pela reintegração, finalizou Doutor Gustavo, juiz substituto da cidade do Prado.
Apesar dessa proposta, os coordenadores da associação não aceitaram, os associados vão realizar uma Assembleia Extraordinária. Onde o defensor público estará presente para garantir a proteção dos moradores vulneráveis. Doutor Gustavo ressaltou que a titularidade da terra não é mais questão de debate, dado que a matrícula é válida e reconhecida.
O advogado da associação Canãa, doutor Abner Petner Alves Rodrigues, criticou o processo, que se arrasta há oito anos, e afirmou que a área é devoluta do Estado para o município. Ele também mencionou que a associação propôs uma contraproposta de 30% da área ao proprietário, mas sem consenso. A assembleia marcada decidirá sobre possíveis termos de acordo.
Doutor Abner, falou que esse não é um procedimento simples; é um processo que se arrasta ao longo de oito anos. Houve uma primeira reintegração em 2018, na qual o tribunal deu uma decisão desfavorável para a Associação Canaã. De lá para cá, nós ocupamos a área novamente, até porque entendemos, não só por pensamento, mas também com documentação, que é uma área devoluta do Estado para o município. Isso é uma área pública, que podemos ocupar, inclusive com aval da Prefeitura. Temos a posse e buscamos essa regularização.
Doutor Abner ainda falou que houve recentemente uma nova reintegração, na qual a parte autora, representada por Marcelo Libano, chegou a oferecer uma proposta de 50% da área: da metade profunda para os associados e da metade para frente, que pega praia, para ele, para fazer seus empreendimentos. Dentro dessa proposta, foi marcada uma audiência de conciliação, realizada há pouco. Nós discutimos, visto que a Associação não abre mão de metade da área, pois nessa metade residem moradores associados, e estamos aqui para brigar por todos, não só por metade. Houve uma contraproposta de que o autor pudesse ter 30% da área, que é a área desocupada e que não tem nenhum associado. Contudo, não chegamos a um consenso. Visando ter um voto popular, um voto da maioria dos associados, já marcamos uma assembleia, inclusive o juiz deu um prazo para que pudéssemos ter uma resposta, para discutir possíveis termos de acordo ou não acordo. Não havendo acordo, o processo continua, até porque só aconteceu uma audiência de conciliação, ainda há muito pela frente. Mas já foi nos dito, de uma maneira até um pouco ortodoxa, que, independentemente do que decidirmos, seria favorável ao autor. Discordando disso, marcamos essa assembleia para que os associados tenham voz e decidam sobre suas moradias, e esse resultado levaremos ao juízo. A partir dali, seguiremos com o processo até o final.
Perguntado ao Doutor Abner por que agora o suposto proprietário resolveu doar 50% da terra para o bairro, alegando ter 100% da área, e sobre um documento onde o próprio governo, na época Jacksvagn, doou aquela parte para o município, ele respondeu que foi levado para a audiência, até pelo magistrado, Doutor Gustavo, que o autor tem uma matrícula mais antiga do que esse decreto, esse registro do município. Então, assim, por prevenção – o que seria essa prevenção? Pelo primeiro ato, o autor teria a posse há mais tempo. E é esse argumento que o tribunal utiliza para não dar embasamento, não reforçar aquilo que nós da associação trouxemos depois.
Então, basicamente, foi desconsiderado o documento posterior e levado em consideração apenas uma matrícula que ainda não tivemos acesso, de difícil acesso. Não sei por que está sob segredo há mais tempo. Por conta disso, está acontecendo esse problema.
O que chama a atenção é que desde o ano (2023) os moradores deram entrada com a documentação, tanto para poder fazer o REURB, e já têm esse requerimento. Inclusive, ele foi aprovado, visto que a lei dá um prazo de 180 dias para o município responder em caso de indeferimento ou mudança. Como eles não responderam, tacitamente a lei permite que o processo siga. Inclusive, estamos fazendo isso de forma independente, já começamos fazendo as avaliações sociais, parte topográfica, de referenciamento, tudo aquilo que o projeto do REURB e a lei 13.465 dizem que deve ser feito para ter essa regularização da área. Visando mais à frente, no processo final, a prefeitura solicitou documentação para dar entrada com o IPTU. Então, o IPTU já deu entrada, já foi gerado, trazendo um benefício para o município. O município está se aproveitando disso de forma legal, isso não é ilegal, para poder gerar uma renda e também para dar frutos através dessa renda gerada pelo IPTU. Não sei se o DAD deste ano já foi expedido, mas a documentação para gerar esse IPTU já foi entregue desde o ano passado. Disse Doutor Abner, advogado da Associação Canaã.
Cintia Jesus dos Santos, coordenadora da Associação Canãa, disse que achou errado como foi realizada a audiência de reconciliação. Segundo ela, várias vezes o promotor e o juiz mencionaram que eles estavam agindo contra a lei, o que gerou insatisfação com a conciliação.
Ainda de acordo com Cintia, o documento que eles têm comprova que a área é 100% do município, e não 50%. “Ontem mesmo fomos ao cartório buscar a documentação da terra e não existe nenhum dono chamado Libânio. Estamos aqui com certidão negativa, não existe Libânio como dono. E mais uma vez ficamos tristes ao ver que nossos direitos estão sendo violados. Estamos brigando por uma terra devoluta, do estado, do município. E os documentos comprovam que a terra é do município.”
Cintia também comentou sobre a proposta do suposto dono da área: “Houve essa fala de que agora o suposto dono da área quer doar 50% e ficar com os outros 50%, propondo um acordo. Não, não existe acordo. Estamos brigando pelos 100% da terra que é devoluta, com documentação comprovando”, disse Cintia.
Em conversa com uma associada, ela nos disse que achou estranha a fala do promotor, que deixou claro que a terra seria do Libânio e que haveria um despejo dos moradores se não aceitassem a proposta do suposto proprietário, utilizando um tom ameaçador. A moradora, que preferiu não se identificar, ainda disse: “O promotor acha que está acima da lei! A lei hoje é para todos. Da mesma forma que ele acha que pode nos intimidar, nós, moradores, podemos levar a gravação ao MPF e pedir uma investigação, pois ele veio com um tom de ameaça. Nós gravamos toda a audiência”.
Os moradores e associados presentes no local acharam estranho que, em nenhum momento, a advogada mostrou o número de registro ou qualquer documento que comprovasse que a área pertence ao Libânio. Em conversa com o advogado da associação, ele informou que também não teve acesso a esse documento até agora.